Pascombras – O senhor já tem uma dimensão dos possíveis impactos do trecho norte do Rodoanel para a Região Brasilândia?
Dom Milton Kenan Junior – O Rodoanel não tem só implicações ambientais e sociais, mas também implicações pastorais. Diversos bairros serão atingidos pelo traçado do trecho norte, bem como áreas das paróquias Nossa Senhora das Dores, em Taipas; São José, no Damasceno; Imaculado Coração de Maria, no Jardim Paraná, Elisa Maria e Vista Alegre; Cristo Ressuscitado, no Jardim Pery; e a Área Pastoral Santo Antônio, no Parque Taipas. Serão diversas as comunidades atingidas.
Pascombras – E como a Região tem se articulado diante dessa realidade?
Dom Milton – Nós construímos uma comissão para a discussão do traçado do trecho norte do Rodoanel, constituída pelos párocos das diversas comunidades que serão atingidas pelo trecho norte e pelos leigos dessas comunidades, além de um grupo de pessoas ligadas à Comissão de Fé e Política e da Cáritas na região. Nós queremos chamar os órgãos competentes, o governo do Estado, a Dersa para o diálogo. Tivemos um contato rápido com o governador e com o presidente da Dersa no qual apresentamos nossas preocupações. Em parte foram respondidas, em parte não. Nosso papel é dialogar, mas dialogar tendo em vista a realidade ambiental, a realidade social e também as consequências pastorais do traçado.
Pascombras – E o destino das famílias também é algo que preocupa...
Dom Milton – Queremos dialogar preocupados com as famílias que deverão ser removidas devido ao Rodoanel. Por baixo, se estima que serão cerca de 4 mil, mas imaginamos um número bem maior, e ai nos perguntamos: serão removidas para onde? Como? Qual a proposta que se tem para elas? Vão residir em uma área distante do lugar de trabalho? Na conversa que tivemos com o presidente da Dersa, ele nos apresentou duas propostas que serão feitas às famílias: todas terão bolsa-aluguel por um período, e será proposta a elas uma indenização pelo imóvel que estão, seja regular ou não. Há a possibilidade de vagas em umas das unidades da CDHU que deverão ser construídas aqui nas regiões noroeste e norte da cidade de São Paulo. Penso que essa proposta deve ser discutida pelos próprios moradores e acompanhada. Seria bom que houvesse um interesse da sociedade em acompanhar a remoção das famílias e a aplicação da proposta para que a gente não venha a assistir situações lamentáveis a essas famílias.
Pascombras – Outro aspecto que preocupa são os impactos ambientais da obra, já que 48% do traçado passará em área de vegetação nativa.
Dom Milton – Alguns ambientalistas falam desses impactos, pois o traçado estará bem próximo da Serra da Cantareira e em alguns trechos deverá cortar a serra. Nós fazemos coro com os ambientalistas. Não é um risco muito grande construir uma rodovia próxima a um local sagrado como a Serra da Cantareira? Um local que garante oxigênio, umidade à cidade de São Paulo. Será que não estão colocando em risco a fauna, a flora dessa região em vista de um progresso? Será que não estão semeando e construindo a morte? É algo a ser considerado.
Pascombras – O clero da região tem falado para os fiéis nas missas, eventos e outros encontros sobre as consequências do Rodoanel?
Dom Milton - Tem muita gente que pensa que o Rodoanel não vai acontecer, mas os padres nas missas devem dizer às comunidades que o Rodoanel está chegando. Então, tem que dizer ‘olha, o Rodoanel está ai, quando baterem na sua casa, você tem que pensar nos seus direitos, naquilo que se oferece em troca’. Não podemos nos iludir com o dinheiro. Dinheiro, se for oferecido, vai ser muito pouco em relação ao que será feito.
Pascombras – No começo das discussões sobre o Rodoanel, alguns políticos vieram à região, mas parece que essa presença já não é tão constante. A Igreja está dialogando sozinha com o governo do Estado?
Dom Milton – A Igreja sempre mantém a sua neutralidade, não assume uma sigla, um mandato partidário. Mas eu acho que os políticos têm um papel importante nesse processo. Àqueles ligados às comunidades mais pobres têm essa sensibilidade com a realidade social. A presença dos políticos será bem vinda no sentido de que eles podem exercer pressão, forçar o diálogo, levar as populações a maior consciência dos passos que estão sendo dados, podem servir como sinal de alerta, de denúncia, e também ajudar no processo de articulação das populações. Os políticos serão bem vindos nessa discussão.
Pascombras – Para finalizarmos, qual a mensagem que o senhor deixa para a os fiéis da Brasilândia referente à participação nas discussões do Rodoanel?
Dom Milton – Quero fazer um apelo para que a gente não desista dessa questão. Enquanto região episcopal, enquanto Igreja, a gente não pode ser calar. É aquilo que Jesus diz: ‘Se eles não gritarem, as pedras gritarão’. Faço um apelo para que todos assumam com mais empenho essa questão do Rodoanel.
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